Duff

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by Kody Keplinger


  outros pensam de m im ? E se eu não ganhar um presente no Dia dos Nam orados?

  É pura vaidade. Quem eu preciso im pressionar?

  — Não sei. Acredito que o Dia dos Nam orados é um a data para se sentir

  especial — disse ele enquanto pegava um a flor do vaso grande. — Acredito que

  toda garota deva se sentir especial de vez em quando, até m esm o você, Bianca.

  — Ele se aproxim ou e pôs a flor atrás da m inha orelha.

  Tentei convencer a m im m esm a que tudo aquilo era um a grande bobagem

  m elodram ática. Se qualquer outro cara — Wesley, por exem plo — tivesse

  tentado fazer algum a coisa parecida, provavelm ente eu teria dado um tapa em

  sua cara ou rido dele. Porém , a única reação que tive foi sentir o rosto

  enrubescer enquanto os dedos de Toby roçavam m inha pele. Não era um cara

  qualquer. Era Toby Tucker. O perfeito, m aravilhoso, adorável Toby Tucker.

  Talvez o Dia dos Nam orados pudesse ser suportável m esm o a um a Duff,

  afinal de contas.

  — Vam os lá — disse ele —, escolha um a pilha e vam os com eçar a distribuir

  os presentes.

  — Hum … certo.

  Nós poderíam os ter entregado aquela pilha inteira antes do fim do prim eiro

  período se a secretária não continuasse a trazer m ais e m ais presentes para a

  m esa cor de vôm ito. Com eçou a ficar claro para m im e para Toby que iríam os

  trabalhar até a hora do alm oço.

  Não que eu m e im portasse em passar a m anhã com ele.

  — Não quero soar precipitado — disse ele quando voltávam os para a m esa,

  apenas cinco m inutos depois do sinal do alm oço —, m as acredito que

  term inam os.

  Alcançam os a m esa vazia e sorrim os um para o outro, apesar de m eu

  coração estar partido.

  — Isso é tudo — falei. — Entregam os os últim os presentes.

  — Isso m esm o. — Toby se inclinou por cim a da m esa. — Quer saber, estou

  feliz que a obrigaram a aj udar. Eu ficaria entediado se precisasse fazer isso

  sozinho. Conversar com você foi divertido.

  — Pra m im tam bém — respondi, evitando soar m uito entusiasm ada.

  — Olha só — disse ele —, você não devia sentar no fundo da sala durante a

  aula de organização política avançada. Por que você não pega um a das carteiras

  que ficam atrás de Jeanine e de m im ? Não existe m otivo pra você ficar lá no

  fundo. Acho que você devia se j untar a nós… aos nerds da prim eira fileira.

  — Talvez. — É claro que eu ia fazer isso. Com o poderia recusar um pedido

  de Toby Tucker?

  — Bianca Piper? — A secretária se aproxim ou de nós. Não havia flores ou

  caixas de doces em suas m ãos dessa vez. — Bianca, alguém veio pedir pra você

  sair m ais cedo hoj e. Vieram buscá-la.

  — Ah… — falei. — Tudo bem . — Estranho. Eu tinha carro. Não precisava

  que ninguém viesse m e buscar.

  — Vej o você m ais tarde, Bianca — disse Toby, enquanto eu seguia a

  secretária para sua m esa na porta de entrada. — Feliz Dia dos Nam orados!

  Acenei antes que ele saísse do m eu cam po de visão, tentando lem brar se eu

  tinha algum a consulta m édica m arcada para aquele dia ou algum a coisa assim .

  Por que alguém pediria que eu saísse da escola m ais cedo? Antes que eu pudesse

  im aginar todas as tragédias fam iliares possíveis, a resposta m e atingiu com o um a

  parede de tij olos, e fiquei estática.

  Ai. Meu. Deus.

  Ela estava parada em frente à m esa da recepção com o se tivesse saído de

  um a produção em algum canto de Holly wood. Cabelos loiros, com m echas m ais

  claras de sol caindo gentilm ente sobre os om bros em ondas perfeitas. Usava um

  vestido j usto um pouco m ais curto, acim a dos j oelhos (sem m eia-calça, é claro)

  e um par de saltos altos. Óculos escuros escondiam seus olhos — olhos que eu

  sabia que eram verdes. Ela ergueu os óculos e se virou para olhar o m eu rosto.

  — Oi, Bianca — disse a bela m ulher.

  — Oi, m ãe.

  capítulo 14

  Eu podia ver seu nervosism o pela form a com o ela andou na m inha direção.

  Parecia abalada, e seus olhos estavam arregalados, com um a expressão que eu

  só podia associar ao m edo. Havia um bom m otivo. Diferentem ente de m eu pai,

  eu sabia que o envio dos papéis do divórcio era escolha dela — e a odiava por

  isso. Por não avisar nenhum de nós. Eu a encarei com um olhar de advertência e

  m e afastei quando ela se aproxim ou de m im . Isso deve ter confirm ado suas

  preocupações, porque ela desviou o olhar para o chão, fixando os olhos na ponta

  de seus sapatos de salto.

  — Senti sua falta, Bianca — disse m inha m ãe.

  — É claro que sentiu.

  — Assinou os papéis de dispensa, sra. Piper? — perguntou a secretária,

  voltando para sua cadeira atrás do balcão da recepção.

  — Sim , assinei — confirm ou m inha m ãe. Sua voz era suave e tinha um tom

  natural. — Então estam os livres para ir em bora?

  — Sim , ela está liberada. — A secretária deu um a risadinha, m exeu no

  cabelo e disse: — Gostaria que você soubesse que com prei seu livro. Ele tem sido

  de grande aj uda para m im , poderia dizer até que salvou m inha vida. Releio todo

  m ês!

  Minha m ãe abriu um sorriso.

  — Olha só, m uito obrigada! Interessante encontrar um a das dez pessoas que

  realm ente leram m eu livro.

  A secretária sorriu de volta.

  — Ele m udou a m inha vida.

  Revirei os olhos.

  Todo m undo am ava m inha m ãe. Divertida, inteligente e arrasadoram ente

  bonita. Ela se parecia m uito com a Um a Thurm an — o m ais longe de ser um a

  Duff que você puder im aginar. Com todas as falhas e erros escondidos por trás do

  rostinho bonito, e com um sorriso capaz de fazer as pessoas acreditarem que ela

  era perfeita. A secretária, que deu m ais um a risadinha e acenou para m inha m ãe

  à m edida que deixávam os a escola, era apenas m ais um a tola enganada pelos

  truques dela.

  — Aonde exatam ente estam os indo? — Eu não m e im portava em esconder

  m inha am argura. Ela m erecia.

  — Ah… não sei — adm itiu m inha m ãe. Seus saltos ecoavam na calçada

  enquanto cam inhava. O som parou quando alcançam os o carro, um Mustang

  verm elho no qual ela parecia estar rodando havia alguns dias. Não era difícil

  perceber que havia dirigido de Orange County até aqui. — Que tal um lugar

  aquecido? — Ela estava tentando parecer descolada. — Meu traseiro está

  congelando!

  — Se você vestisse roupas decentes, não teria esse tipo de problem as. —

  Quase arranquei a porta do passageiro quando a abri, e j oguei todo o lixo do

  assento no chão antes de entrar no carro. — Desculpe, não estam os na Califórnia.

  Faz frio por aqui.

  — Ah, Califórnia. Que lugarzinho problem ático... — disse m am ãe. Ela

  parecia tensa quando entrou no carro, e sua risada abobada era claram ente de

  nervosism o, não de bom hum or. — Não é tão divertido quanto nos film es, sabia?

  — Sério? Que estranho. Você parece estar gostando m ais de lá do que de

  Ham ilton. Mas, pra você, qualquer lugar é m elhor do que aqui, não é m esm o?


  A risada m orreu, o carro ficou silencioso. Mam ãe girou a chave e ligou o

  m otor, saindo do estacionam ento. Finalm ente, com o veículo em m ovim ento, ela

  m urm urou:

  — Bianca, precisam os falar sobre isso. Não sei se você consegue entender o

  tipo de problem a que estou enfrentando agora.

  — Com certeza, parece um a fase bem difícil, m ãe — provoquei. — Por

  sinal, belo bronzeado. Orange County parece ser o inferno na Terra. Não sei

  com o você consegue viver naquele lugar.

  — Bianca Ly nne Piper, não vou aceitar esse com portam ento vindo de você!

  — ela gritou. — Ao contrário do que você parece estar pensando, eu ainda sou

  sua m ãe e m ereço ser tratada com respeito!

  — Sério m esm o? — rosnei em resposta. — Com o o respeito que você teve

  pelo m eu pai ao enviar a papelada do divórcio sem sequer prepará-lo? Ou a

  m im ? Pelo am or de Deus, m ãe! Qual é o seu problem a?

  Mais alguns instantes de silêncio.

  Eu sabia que esse tipo de discussão não nos levaria a lugar algum . Sabia que

  devia ouvir o que m inha m ãe tinha a dizer, ver as coisas sob seu prism a e dividir

  m eus sentim entos de form a racional. Eu havia assistido a m uitos episódios de Dr.

  Phil para entender que precisávam os entrar em um acordo, m as a realidade é

  que não queria um . Egoísta, infantil, im atura… Posso ter sido tudo isso, porém a

  expressão do m eu pai, rodeado pelas garrafas vazias que eu havia recolhido na

  sem ana passada, e a m aldita papelada do divórcio não saíam da m inha cabeça.

  Ouvir? Entender? Ser racional? Com o isso poderia sequer ser um a opção? Ela era

  m ais infantil e im atura do que eu. A única diferença era que sabia esconder

  m elhor.

  Eu a escutei respirar fundo antes de parar o carro no acostam ento. Ela

  desligou o m otor sem dizer um a palavra, e eu desviei o olhar para os cam pos

  vazios que se estendiam à nossa frente; estariam cobertos de m ilho assim que o

  verão chegasse. O céu cinzento de fevereiro falava por nós. O frio. A falta de

  vida. Um dia desperdiçado. Um dia perdido. Um esforço desnecessário. Eu não

  com eçaria a conversa. Era a chance da m inha m ãe ser a adulta, ao m enos um a

  vez na vida.

  Os segundos passavam . O único som audível no carro era nossa respiração.

  Mam ãe se m exia com o se estivesse prestes a dizer algum a coisa, m as seus lábios

  se fechavam antes que qualquer som escapasse. Esperei.

  — Bianca… — com eçou ela. Passaram -se cinco m inutos até que enfim

  continuasse: — Eu sinto m uito, m uito m esm o.

  Eu não disse um a palavra.

  — Eu não queria que acabasse assim . — A voz dela falhava, m as eu não

  virei o rosto para ver se estava chorando. — Não m e sentia feliz há m uito tem po.

  Quando sua avó m orreu, seu pai sugeriu que eu fizesse um a viagem . Achei que a

  ideia poderia funcionar. Escapar um pouco, dar algum as palestras em lugares

  diferentes e voltar. Pensei que, ao voltar, tudo ficaria bem novam ente, com o era

  antes, com o era quando ele e eu nos casam os. Mas…

  Seus longos dedos trem iam quando ela fechou as m ãos sobre a m inha. De

  form a relutante, olhei para ela. Não havia lágrim as correndo pelo seu rosto, m as

  eu podia perceber o brilho no canto de seus olhos. A represa não havia rom pido

  ainda.

  — Eu estava errada — disse ela. — Pensei que podia fugir de m eus

  problem as, m as estava tão errada, Bianca... Não im porta aonde você vá ou o que

  você faça para se distrair, a realidade alcança você. Eu voltei para casa e, depois

  de alguns dias, estava sentindo tudo novam ente, então parti para m ais um a

  viagem . Eu ficaria fora por um tem po um pouco m aior, agendaria m ais

  palestras, iria para lugares m ais distantes… até que não havia m ais para onde ir.

  Quando percebi, estava no lado oposto do país, não havia m ais para onde fugir.

  Eu precisava… eu tinha de enfrentar a realidade.

  — Qual realidade?

  — Que eu não queria m ais o seu pai. — Ela olhou para as nossas m ãos,

  ainda entrelaçadas. — Eu ainda am o m uito o seu pai, m as não com o m arido e

  m ulher, não da form a com o ele m e am a. Pode soar com o um grande clichê,

  m as é a verdade. Não podia continuar fingindo que tudo estava bem entre nós.

  Desculpe-m e.

  — Então você quer o divórcio?

  — Sim .

  Olhei para os cam pos vazios à m inha frente. Ainda cinzentos. Ainda frios.

  — Você terá de contar ao papai — falei. — Ele ainda pensa que houve um

  engano. Ele se recusa a acreditar que você… que você faria algo assim com nós

  dois.

  — Você m e odeia?

  — Não.

  A resposta não m e surpreendeu, m esm o que a negativa sim plesm ente tenha

  voado da m inha boca. Eu queria odiar a m inha m ãe. Não tanto por causa do

  divórcio; j á fazia um tem po que ela havia nos deixado, e a ideia de m orar com

  apenas um de m eus pais não era algo que m e deixasse para baixo. E, afinal, j á

  estava na hora de o divórcio ser oficializado. Eu queria ter o poder de odiá-la pelo

  m eu pai. Pela dor que ela estava causando a ele. Pela noite em que ele teve a

  recaída.

  Foi quando a verdade m e atingiu. Ela não era a culpada pela recaída de m eu

  pai. Eu podia culpá-la quanto quisesse, m as isso não faria bem nenhum . Ela

  precisava assum ir a responsabilidade pela vida dela, e m eu pai pela dele. Por

  terem perm anecido casados, por terem deixado as coisas chegar a esse ponto nos

  últim os três anos, os dois estavam vivendo em negação.

  Minha m ãe finalm ente enfrentava a realidade. Meu pai teria de enfrentá-la

  tam bém .

  — Eu não odeio você, m ãe.

  O céu estava escuro havia horas quando ela m e deixou no estacionam ento da

  escola, onde estava m eu carro. Passam os a tarde dirigindo por Ham ilton,

  conversando sobre tudo o que ela perdeu. Da m esm a form a que fazíam os toda

  vez que ela voltava de um a turnê. A diferença era que dessa vez ela não voltaria

  para nossa casa, ao m enos não para passar a noite.

  — Preciso ver seu pai agora — disse m inha m ãe. — Acho que seria um a

  boa se você passasse a noite com a Casey, docinho. Não tenho ideia de com o ele

  vai reagir… Quer dizer, sei exatam ente com o ele vai reagir, e não vai ser bom .

  Assenti, concordando, esperando estar errada — apesar de nossas definições

  de não vai ser bom serem m uito diferentes. Não havia m encionado para m am ãe

  que ele teve um a recaída, principalm ente porque não houve um grande dram a

  pelo fato. Ela estava com m edo dos berros e das lágrim as — coisas que se

  esperam de um confronto com o esse. Eu não queria que ela se preocupasse com

  a bebida tam bém . Especialm ente porque não tinha sido grande coisa.

  — Deus — suspirou ela —, m e sinto horrível! Estou prestes a contar para o

  m eu m arido que quero m e divorciar, ainda por cim a no Dia dos Nam orados. Eu

  sou um a… vaca. Talvez eu devesse esperar até am anhã e…

  — Você precisa falar com ele, m ãe. Se não colocar tudo pra fora agora,

  você nunca vai fazer isso. — Soltei m eu cinto de segurança. — Vo
u ligar pra

  Casey e ver se posso ficar esta noite com ela. É m elhor ir agora… antes que sej a

  tarde dem ais.

  — Tudo bem . — Ela inspirou com força e expirou vagarosam ente. — Certo,

  eu vou.

  Abri a porta do Mustang e saí.

  — Vai dar tudo certo.

  Ela assentiu e girou a chave na ignição.

  — Você não devia ser a adulta da relação — m urm urou. — Eu sou a m ãe,

  eu que deveria estar confortando você, e não o contrário. Que fam ília

  disfuncional.

  — A funcionalidade é superestim ada. — Dei a ela um sorriso de segurança.

  — Nos falam os am anhã, boa sorte!

  — Obrigada, querida. Am o você.

  — Tam bém am o você.

  — Tchau, m eu bebê.

  Fechei a porta e m e afastei. Com o m eu sorriso firm e, acenei enquanto o

  pequeno Mustang verm elho m anobrava para fora do estacionam ento em direção

  à autoestrada, onde hesitou com o se debatesse se devia ou não prosseguir. Mas

  m inha m ãe acelerou. Eu continuei acenando.

  Assim que o carro sum iu da m inha vista, perm iti que, aos poucos, o sorriso

  saísse do m eu rosto. Sim , eu sabia que as coisas ficariam bem . Sim , sabia que

  m inha m ãe estava fazendo a coisa certa. Sim , sabia que esse era o prim eiro

  passo na direção correta para m eus pais. Contudo tam bém sabia que papai não

  veria dessa form a… pelo m enos não no com eço. Eu sorria para dar confiança a

  m inha m ãe, m as para m eu pai eu balançava a cabeça.

  Tirei as chaves do bolso traseiro e destranquei o carro. Após j ogar m inhas

  coisas no banco do passageiro, entrei e fechei a porta, criando um m uro entre

  m eu corpo, que trem ia de frio, e a noite de fevereiro. Por vários m inutos fiquei

  lá, sentada em silêncio, tentando não pensar nos m eus pais.

  Era im possível, é claro.

  Enfiei m inha m ão dentro da bolsa e com ecei a rem exer entre canetas e

  pacotes vazios de chiclete. Finalm ente achei m eu celular. Eu o apanhei e fiquei

  com os dedos parados sobre o teclado.

  Não liguei para Casey.

  Esperei cham ar três vezes até que a ligação foi atendida.

  — Oi, é a Bianca. Ahn… Você ainda está ocupado?

  — Você está brincando com igo, né?

  Eu olhava para a grande tela de televisão, sentindo m eu rosto ficar quente.

 

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